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sexta-feira, 6 de junho de 2008

A ESTRADA REAL

No meio do século 17, por volta do ano de 1654, a crise econômica e a concorrência que desvalorizavam o açúcar no mercado internacional tornaram necessário que fossem encontradas novas fontes de geração de capital e riquezas, a fim de substituírem as plantações de cana no Brasil colônia.


Sendo assim, partiram várias expedições ou bandeiras da pequena Vila de São Paulo que, na época, possuía apenas algumas centenas de habitantes. Seus integrantes, chamados de bandeirantes, como os pioneiros Jacques Felix e Fernão Dias, eram mestiços de portugueses com índios, e utilizavam os caminhos milenares abertos pelos indígenas, além de suas técnicas de sobrevivência nos desconhecidos lugares que desbravavam.

Bandeirantes paulistas, cujas principais atividades iniciais foram, de bacamartes em punho, a ampliação das fronterias do que hoje se chama Brasil, e a caça e captura de índios nos sertões de São Paulo e Minas Gerais


Foi através de um desses caminhos, conhecido como Trilha dos Guaianazes, que os bandeirantes partiram do Vale do Paraíba paulista e, passando pela Garganta do Embaú, ponto mais baixo em toda a extensão da Serra da Mantiqueira, chegaram a um imenso sertão que seria chamado mais tarde de Minas Gerais. O trajeto recebeu o nome de Caminho Geral do Sertão, e ligava a Capitania de São Paulo às Minas.


Os primeiros bandeirantes que passavam por certo lugar, deixavam ali para os viajantes posteriores, pequenas roças plantadas, local para descanso e, às vezes, erguiam uma rústica capela. Essas paradas originaram os núcleos de muitas cidades do interior de São Paulo e Minas Gerais.


No final do século 17, foi descoberto ouro, assim como diamantes e outras pedras preciosas em território mineiro. Por ser a principal via de escoamento da mineração, o Caminho Geral do Sertão era muito utilizado para o transporte de grandes riquezas em carregamentos de ouro e pedras preciosas.

Por esse motivo, a Coroa Portuguesa passou a atribuir natureza oficial ao caminho, chamando-o de Estrada Real. Tinha início em Diamantina, no norte de Minas, e passava por Vila Rica (atual Ouro Preto), de onde se bifurcava, dando origem ao Caminho Velho e ao Caminho Novo. O Caminho Velho da Estrada Real percorria o interior de Minas Gerais e entrava em São Paulo, cruzando a divisa entre os dois estados no alto da Serra da Mantiqueira, através de seu ponto mais baixo, a Garganta do Embaú, e descia para o fundo do Vale do Paraíba paulista.

Em território paulista, a Estrada Real passa pelos municípios de Cruzeiro, Cachoeira Paulista, Lorena, Guaratinguetá e Cunha, chegando finalmente a Paraty, no litoral sul do estado do Rio, de onde o ouro e as pedras preciosas eram embarcados para Portugal. Os 1200 quilômetros do Caminho Velho da Estrada Real eram percorridos em aproximadamente 95 dias de viagem.


Símbolo da Estrada Real, ...


que começa em Diamantina, no norte de Minas, e vai até Ouro Preto; esse trecho, em preto no mapa, tinha o nome de Trilha dos Diamantes. A partir de Ouro Preto, a Estrada Real se bifurca entre o Caminho Velho, à esquerda em marrom, que termina em Paraty/RJ, e o Caminho Novo, em vermelho, que passa por Juiz de Fora/MG, Petrópolis/RJ, e chaga ao norte da Baía de Guanabara, de onde o ouro e as pedras preciosas eram levados ao porto do Rio de Janeiro e embarcados para Portugal

Duas imagens de trechos preservados da Estrada Real em território mineiro, ...


onde ainda é possível observar a pavimentação original do século 18, em blocos de pedras


Paraty, no RJ, onde o Caminho Velho da Estrada Real termina após cruzar a Serra da Mantiqueira, o Vale do Paraíba paulista e a Serra do Mar, ao fundo

A Estrada Real também servia para o escoamento e o transporte de escravos, mercadorias e animais. E sobre tudo isso pagava-se imposto; mas o que interessava mesmo à Coroa Portuguesa era o Quinto. De toda e qualquer quantidade de ouro ou diamante que fosse transportada pela Estrada Real, deveria ser dado um quinto como imposto à Coroa Portuguesa; e foi daí que surgiu a expressão atual "quinto dos infernos".
Em 2001, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG) criou o Instituto Estrada Real, que tem o propósito de promover o reconhecimento histórico e cultural do caminho

Os 1400 quilômetros das três vias da Estrada Real (Caminho dos Diamantes, Caminho Velho e Caminho Novo), que passam por 162 municípios de Minas, 7 de São Paulo e 8 do Rio de Janeiro, estão recebendo marcos indicativos graças a uma parceria entre FIEMG e geógrafos da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais)


O projeto prevê a instalação de 1927 marcos ao longo da Estrada Real, dos quais, já foram colocados mais de 800. Cada exemplar possui informações com a indicação do município mais próximo, telefones úteis, atrativos da região, distâncias em quilômetros e localização do ponto por GPS


Para fiscalizar, controlar e cobrar os impostos, Portugal criou espécies de pedágios chamados de registros. Esses registros eram pequenas construções localizadas em pontos estratégicos da Estrada Real, como margens de rios, desfiladeiros e passagens de serras, onde havia um portão com cadeado.

Em cada registro, sempre ficavam dois ou quatro soldados, um contador, um administrador e um fiel. Um desses registros ficava na Garganta do Embaú, no cruzamento da Estrada Real com o ponto mais baixo em toda a extensão longitudinal de 500 quilômetros da Serra da Mantiqueira.

Trecho da Estrada Real em Guaratinguetá/SP, ...

de onde é possível observar o relevo da Serra da Mantiqueira ao fundo. O relevo da Serra se abaixa formando a Garganta do Embaú, por onde os bandeirantes paulistas, no século 17, chegaram às Gerais, do outro lado, e por onde o curso do Caminho Velho da Estrada Real vem e entra em SP. Um dos postos de registro de cobrança do "Quinto" ficava no alto da Graganta do Embaú, em função de sua localização estratégica


Todo esse apogeu da mineração nas Gerais se estendeu pelo século 18 inteiro, e terminou no início do século 19, quando os caminhos da Estrada Real passaram a ser livres. Porém, seus traçados formaram o principal fator de ligação com o litoral e ampliação territorial da américa portuguesa, além da integração do que hoje é a Região Sudeste do Brasil.

A Estrada Real contribuiu de forma significativa para o encontro e a fusão de diversas culturas: imigrantes paulistas, pernambucanos, baianos, europeus, tropeiros do sul, escravos negros e índios. Diversas cidades do sudeste brasileiro surgiram a partir de pequenas capelas, vendas e ranchos de tropas instalados ao longo da Estrada Real e de outros caminhos oficiais da época. Passa por este trajeto, ou melhor, pela Estrada Real, a História do Brasil.

Cássio Ribeiro

Críticas e sugestões: e-mail zzaapp@ig.com.br e orkut http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=18423333339962056517

2 Comentários:

  • “REFLEXÕES SOBRE O “ROTEIRO DO CAMINHO DE SÃO PAULO PARA MINAS GERAIS, E PARA O RIO DAS VELHAS”.Ainda que não venha dedicando grande tempo à pesquisa, em minhas andanças pelos sebos de São Paulo, sempre que posso vou colhendo material relacionado à História da origem de Piquete. No dia 24 de outubro de 2008, deparei com uma obra cujo titulo chamou atenção: (LEITE, Mário). A Região da Mantiqueira, Ensaio Descritivo. Lisboa-Portugal: Composto e Impresso Na Sociedade Industrial de Tipografia, Limitada, 1951, 1.º ed.Compulsando a obra deparei com algumas considerações no sentido da existência de outros caminhos além da garganta do Embaú, de acesso as Minas Gerais, como exemplo, o caminho da Bahia. Quando então afirma na p. 123 da obra adrede citada:“Ainda Orville Derby nos dá noticias de caminhos interiores da Mantiqueira, entre - ligados com os de acesso da Serra, vindos do Rio e de São Paulo. A descoberta de ouro nas cabeceiras dos afluentes dos rios Grandes, Doce e S. Francisco tinham criado vários centros de população interior, ligados com a estrada de Taubaté a Parati por uma estrada entre Guaratinguetá e São João d’El Rei, que atravessa sertão bruto”. Em seguida afirma o autor: “Essa estrada vem relatada na obra de Antonil intitulada “Cultura e Opulência do Brasil”, publicada em 1711, com o titulo “Roteiro do Caminho de São Paulo para as Minas Gerais e para os Rios das velhas e é descrita no volume XI DOS “Documentos Interessantes de Orville Derby”. Estupefato ao passar os olhos pelo roteiro do caminho, parafraseando a professora Doli de Castro Ferreira, (que em documento importante de sua lavra afirma: “Se em 1828 o Bairro possuía essas referências, "Piquete", vinha de mais longe a sua origem”) Em conformidade com o tema então desenvolvido pela pequisadora quando da publicação de seu artigo (A Origem da Cidade de Piquete) em que sua observação deveu-se ao fato de existir documento de 1828, onde foi citado o Bairro Piquete o qual constituia-se de um pequeno povoado. A partir da mesma constatação no que tange ao roteiro de viajem citado, um documento de 1711, dando conta de uma localidade, localizada entre o porto guaypacaré e o pé da serra da Mantiqueira, percorrido em dois dias , fiz a mesma indagação, sendo levado a seguinte resposta; “um núcleo populacional solidificou com grande diversidade produtiva, trilhado por expedições rumo a Gerais “vinha de mais longe sua origem”“. Ou seja, entre travessia do rio paraíba até o vale do Embaú, já existia um núcleo populacional em atividade, correspondente indiscutivelmente ao território em que esta contido Piquete, sendo esse o núcleo embrião de sua origem, o qual constituia-se de (Ranchos e pousos)de mineiros. Ademais, muitos dos documentos, ou seja, Mapas, divulgados pelo próprio projeto Estrada Real, da conta do verdadeiro trajeto, na certeza de que, não existia outro forma de acesso a Garganta do Embaú, que não fosse pelo Núcleo que deu origem a Piquete. Sérgio dos Santos

    Por Blogger Sérgio dos Santos, às 13 de junho de 2009 às 18:51  

  • No fim de Junho fiz uma Viagem pela Estrada Real, saindo de Nova Lima e chegando a Paraty. Procurando um link para a Garganta do Embau achei o seu blog que considerei um dos melhores textos sobre a Estrada Real com que me deparei até agora. Tomei a liberdade e fiz um link de meu blog direto para cá e ficaria satisfeito se fizesse uma visita e, caso achasse adequado, difundi-lo em seu site de forma que mais pessoas se interessem por este que considero um dos tesouros escondidos das Minas Gerais.
    http://estradareal4x4.blogspot.com
    Fico grato e a disposição.

    Moacir Ladeira

    Por Blogger MLadeira, às 7 de setembro de 2011 às 16:14  

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