O CAFÉ NA MORAL DA HISTÓRIA
Um pastor chamado Kaldi começou a perceber que suas ovelhas ficavam saltitantes, loucas e felizes, parecendo "eletrificadas", todas as vezes em que comiam as tais frutinhas penduradas naqueles arbustos. O rebanho de ovelhas também demonstrava disposição para percorrer muitos quilômetros em íngremes terrenos, após a ingestão das tais frutinhas.
O pastor Kaldi decidiu então comer algumas daquelas frutas e ficou estimulado e agitado como seus animais. Um frade observara o fato e, classificando as frutinhas como "coisas do demônio", resolveu levar algumas delas para serem exorcizadas. Jogou-as na fogueira e, subitamente, um doce e inconfundível aroma tomou conta dos ares de seu monastério.
Os árabes passaram a controlar de forma exclusiva o cultivo dos pés de café. Era proibido aos estrangeiros chegarem perto das plantações, que os árabes protegiam com a própria vida. As sementes ou grãos de café só eram comercializados com outros povos depois de estarem sem fertilidade, o que garantia aos árabes o monopólio da venda do produto tão apreciado no mundo conhecido da época. Uma lei árabe de 1475 garantia que qualquer mulher poderia pedir o divórcio, caso o marido não fosse capaz de dar-lhe uma certa quantidade de café todos os dias.
O próprio nome café tem origem na palavra árabe qahwa, que significa vinho. Sendo assim, o café ficou conhecido como o "vinho da arábia", quando chegou à Europa no século 14, por ocasião da invasão árabe naquele continente.
No século 17, o café já era consumido em larga escala na Europa, mas só os árabes vendiam o produto. Italianos, alemães e franceses tentavam sem sucesso, desenvolver o cultivo da planta do café.
Foram os holandeses que conseguiram desenvolver as primeiras mudas nas estufas do Jardim Botânico de Amsterdã. O café passava então, do cultivo ao consumo, a fazer parte da vida diária dos europeus. Outros países buscavam o desenvolvimento da técnica de plantio, a fim de obterem também os grandes lucros gerados pela comercialização do produto.
Artefatos holandeses utilizados na moagem e no preparo do café
O sargento-mor Francisco de Mello Palheta foi enviado ao Suriname com a incumbência de trazer a primeira muda de café para o Brasil. Palheta adquiriu a confiança da esposa do governador da Caiena, capital do Suriname, e recebeu dela clandestinamente, uma pequena muda da planta café arábica.
O brasileiro trouxe a pequenina planta para o Brasil escondida na bagagem. Chagava ao país, precisamente em Belém do Pará, no ano de 1727, a primeira muda do produto que revolucionaria a estrutura econômica colonial brasileira pouco tempo depois.
O café logo se espalhou pela Bahia, Maranhão, Rio de Janeiro, Paraná e São Paulo, pois as condições climáticas brasileiras proporcionavam o fácil desenvolvimento da planta. O produto passou a ser o símbolo principal da economia brasileira e seu cultivo foi realizado apenas com recursos nacionais, gerando riquezas de forma independente, a partir das plantações dentro do Brasil Colônia.
No final do século 18, o Haiti, que era colônia francesa e o principal produtor e exportador de café do mundo, foi arrasado pela crise gerada em função da guerra de independência contra a França. Foi a brecha para o Brasil aumentar a produção e a exportação do produto.
Durante todo o século 19, e boa parte do século 20, o café foi a grande riqueza absoluta brasileira, responsável pelo desenvolvimento do país e pela sua participação no comércio internacional.
Inicialmente, o norte do Paraná, o sul de Minas Gerais e a região do Vale do Paraíba Paulista foram os locais que mais se destacaram. No Vale do Rio Paraíba do Sul, em São Paulo, o café possibilitou o desenvolvimento de cidades como Guaratinguetá e Taubaté, além do surgimento de uma classe social extremamente rica, os barões do café, que traziam roupas e talheres importados da frança, e ergueram luxuosos casarões de fazenda. A ferrovia chegou em meados do século 19, dinamizando o escoamento e a exportação do chamado "ouro negro" brasileiro.
Nunca pode ser esquecido que toda a riqueza e a prosperidade ocorridas na economia brasileira
Casarão que pertenceu ao Barão de Guaratinguetá. Atualmente, o palácio abriga as instalações do Instituto de Educação, uma das escolas responsáveis pelo Ensino Médio na cidade
A imponência da arquitetura, como também o luxo usufruído pela aristocracia cafeeira paulista e brasileira...
A marca de café brasileiro mais conhecida na época foi a Santos. Muitas pessoas acham que o nome se referia à cidade de Santos/SP, porém, a marca Santos pertencia a família do célebre Alberto Santos Dumont que, além de ser considerado o pai da aviação, também foi um expressivo "barão" paulista cafeeiro. Outro conhecido representante da economia cafeeira paulista, e neto do Barão de Tremembé, foi o consagrado escritor de Taubaté, Monteiro Lobato. As terras do Vale do Paraíba Paulista, embora extremamente férteis no início da produção cafeeira na região, começaram a das sinas de esgotamento e escassez de nutrientes no final do século 19.
Monteiro Lobato retrata no livro "Cidades Mortas" o cenário do declínio do apogeu do café na região, que esvaziou economicamente cidades valeparaibanas paulistas, antes consideradas as mais ricas do Brasil nos tempos áureos do café, e que passaram à condição de meros centros turísticos algumas décadas depois.
Embora hoje o café não seja mais o principal produto da economia brasileira, o Brasil ainda é o maior produtor mundial de café. Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), o Brasil é responsável por 30% do mercado internacional do café, que corresponde também à soma da produção dos outros seis maiores produtores mundiais (Colômbia, México, Guatemala, Indonésia, Vietnã e Costa do Marfim). O Brasil, onde 90% da população admira o cafezinho diário, é o segundo maior consumidor mundial do produto, ficando atrás apenas dos Estados Unidos.
Cássio Ribeiro. E-mail: zzaapp@ig.com.br
0 Comentários:
Postar um comentário
<< Home