O CAFÉ NO CORPO HUMANO
Assim como a teofilina no chá, a teobromina no cacau e a cocaína na folha de coca, a cafeína também pertence ao grupo dos alcalóides vegetais, que são estimulantes do sistema nervoso central chamados de xantinas, responsáveis por estados de alerta de curta duração nos indivíduos.
Separada dos grãos de café, a cafeína pura tem o aspecto de um pó branco, amargo e extremamente solúvel em água. A estrutura molecular da cafeína é muitíssimo parecida com a da adenosina, que é uma substância natural do cérebro liberada pelos neurônios, e responsável pelo estímulo do sono e pela baixa dos batimentos cardíacos e da pressão sangüínea.
Como é muito parecida com a adenosina, a cafeína ocupa seu lugar na ligação com os neurônios, impedindo que a atividade elétrica das células cerebrais fique lenta. "Para alguns indivíduos, a cafeína está relacionada com a melhora dos níveis de atenção, sensação de bem-estar e aumento da disposição", explica Maria de Fátima Ferreira, nutricionista do INCOR (Instituto do Coração) de SP.
No geral, as reações apresentadas por quem ingere a cafeína são a melhora da atividade intelectual, clareza do raciocínio e aumento da velocidade das associações de idéias, exaltação das fantasias, sensação de bem-estar, agilidade no tempo de reação e reflexo, além da redução da sonolência e da fadiga. O pico dos efeitos da cafeína ocorre entre 30 e 60 minutos após a ingestão, e pode durar entre 3 e 10 horas.
O bebedor habitual de café tem o organismo adaptado, por meio da tolerância, às alterações que a bebida causa no equilíbrio natural do corpo. Sendo assim, para sentir os efeitos dos estímulos da cafeína sobre sua personalidade, seria interessante ficar sem consumir café por um mês.
Este indivíduo então poderá perceber que suas constantes oscilações de humor — ora motivado, cheio de energia, alegre, hilário e propenso a longas conversações; ora desanimado, às portas da depressão e sem vontade de conversar — são efeitos das várias doses diárias de café ingeridas por ele.
Para os indivíduos não habituados à ingestão da cafeína, poderá ocorrer a intoxicação aguda caso as doses diárias sejam exageradas. Tal intoxicação será caracterizada por inquietação, nervosismo, excitação, insônia, rubor facial, rapidez no pensamento, alterações digestivas, contrações musculares, taquicardia e, em alguns casos, até arritmia cardíaca.
Para os atletas, principalmente os de maratona, os treinos condicionam o cérebro a produzir endorfina, que é uma substância responsável pelo bem-estar e pela promoção do bom humor. Essa endorfina produzida durante os exercícios também age como uma forma de gratificação sobre o corpo, e possibilita aos atletas treinados, continuarem correndo mesmo após seu estágio máximo de cansaço, o que para um não atleta representaria parar imediatamente o exercício por ação da fadiga.
Se os atletas consumirem uma dose mínima diária de café (4 xícaras), os ácidos clorogênicos presentes na bebida exercerão um bloqueio sobre os receptores cerebrais que são estimulados pela endorfina. Desta forma, motivado pelo bloqueio promovido pelo café, o cérebro aprende a aumentar a produção de endorfina que estimula, num nível mais alto, o atleta a prosseguir durante a atividade física.
Treinando assim, os atletas acabam condicionando o cérebro contra uma resistência de absorção da endorfina, ocasionada pelo café. Logo, quando esta resistência for cessada, com a interrupção da ingestão do café, o cérebro estará condicionado a produzir mais endorfina, sem que haja qualquer resistência na absorção de toda ela pelo organismo.
A performance desses atletas poderá ser melhorada significativamente durante uma prova de maratona, sem que exista o "doping"; apenas com o aumento da capacidade natural do corpo de ir mais além, estimulado pela absorção integral de uma alta dose de endorfina. Porém, o Comitê Olímpico Internacional desclassifica os atletas que apresentam altas doses de cafeína no sangue durante a realização das provas.
Nas características relativas à prevenção de doenças, o café possui pontos positivos estabelecidos pelas comunidades científicas. Estudos feitos em pessoas sem qualquer doença, em países europeus e nos Estados Unidos, demostraram que, em períodos que variam entre 8 e 15 anos, a ingestão diária de café reduz os riscos de aparecimento do diabetes tipo 2 (não hereditário e que se manifesta na fase adulta), em relação aos indivíduos que não bebem café.
Foi constatado que o diabetes era ainda mais raro, quanto maior fosse a quantidade de café ingerido. Indivíduos que tomavam mais de 3 xícaras por dia (150ml), apresentavam menor índice de desenvolvimento da doença. "Por conta das pesquisas, podemos dizer que o café, ao que tudo indica, ‘protege’ as pessoas do diabetes", afirma o diretor da Unidade Clínica de Coronariopatia Crônica do INCOR, Luiz Antônio Machado César.
Quanto à depressão, alguns especialistas garantem que é menor a incidência de depressão e dependência química em pessoas que consomem café diariamente. "Isso se dá devido à cafeína e ao ácido clorogênico que atuam nas células nervosas e evitam que os componentes das drogas (lícitas e ilícitas) proporcionem a sensação caraterística de prazer", explica Darcy Roberto Lima, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e pesquisador da Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos.
O professor Darcy Lima, que acompanhou por uma década 106 mil estudantes de 10 a 20 anos em seis estados brasileiros, é especialista na bioquímica do café e entusiasta de suas propriedades nutricionais e farmacêuticas, sendo defensor da obrigatoriedade do café com leite na merenda escolar.
Na década de 1990, o professor Darcy acompanhou em regiões produtoras de café do Brasil, grupos de estudantes e constatou que os índices de depressão e obesidade entre os pesquisados eram muito menores que em regiões onde alimentos calóricos e gordurosos predominam. "Como a obesidade é um dos fatores que pode determinar o desenvolvimento do quadro de diabetes, o café atuaria desde a infância como preventivo do problema", explica o médico.
Em relação à quantidade, os especialistas são unânimes ao afirmarem que não é bom exagerar. Eles afirmam que podem ser ingeridas até 4 xícaras de café por dia, dos 18 aos 65 anos, e, após essa idade, até 3 xícaras diárias. Acima desse limite, o café pode fazer mal, como qualquer outro alimento ingerido em excesso. Outra recomendação é a de que o café seja bebido durante o dia, a fim de se evitar a insônia.
O café deve ser consumido com cautela por gestantes, principalmente aquelas que são mais sensíveis a sua ação, já que possivelmente a ingestão de café ocasione contrações do útero, aumentando o risco de aborto espontâneo.
Dos tempos em que crescia selvagem nas montanhas africanas da Etiópia, há mais de 1500 anos, até os dias atuais, onde as prateleiras dos supermercados oferecem grande variedade de marcas, opções de consumo e até de sabores, o café, em meio a seus prós e contras, segue absoluto e presente entre as opções de degustação nos quatro cantos do mundo. Aprecie com moderação.
Cássio Ribeiro. E-mail: zzaapp@ig.com.br
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